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Origens e Evolução do Karatedō (空手道)

 

Segundo os historiadores modernos, as origens do Karatedō podem ser rastreadas até o século VI, quando, na China, um monge chamado Bodhidharma (菩提達磨, em japonês Daruma) teria ensinado uma série de exercícios aos monges do templo Shàolín (少林寺), localizado na província de Hénán (河南).

 

De acordo com a tradição, os monges eram fisicamente enfraquecidos devido aos longos períodos de meditação. Assim, os exercícios criados por Bodhidharma tinham como objetivo fortalecê-los fisicamente e capacitá-los a se defenderem de bandidos e criminosos.

 

O sutra atribuído a Bodhidharma era chamado Ekkin-kyō (易筋経), conhecido em chinês como Yìjīnjīng, que significa “Clássico da Transformação dos Músculos e Tendões”. Acredita-se que esse ensinamento tenha influenciado o desenvolvimento do Shàolín-quán (少林拳) – os “Punhos de Shaolin”.

 

Entretanto, a relação direta entre Bodhidharma e as origens do Karatedō é historicamente incerta. Devido à falta de registros documentais, tal conexão permanece envolta em lenda, sendo considerada uma construção simbólica que associa a disciplina física ao cultivo espiritual.

 

Influências Chinesas e Contexto de Okinawa

 

Antigamente, não havia proibições ao porte de armas, e, portanto, era comum a existência de sistemas de combate armados nas mais diversas culturas, tanto orientais quanto ocidentais. No Japão, os samurai (侍) tornaram-se célebres pela maestria com a espada, símbolo de sua classe social e espiritual. Regidos pelo código de honra Bushidō (武士道) — consolidado entre os séculos XVII e XVIII —, os samurai praticavam diariamente o manejo da espada (kenjutsu) e consideravam a lâmina uma extensão da própria alma.

 

No caso de Okinawa, o cenário foi distinto. No final do século XIV, o arquipélago estabeleceu intenso intercâmbio cultural e comercial com a China, o que propiciou a introdução de diversas práticas marciais chinesas, posteriormente adaptadas à cultura local.

 

Dois eventos políticos foram decisivos para a formação do Tī (手), o ancestral do Karatedō:

  1. O decreto do rei Shō Shin (尚真, 1477–1526), que proibiu o porte de armas em Okinawa;

  2. A invasão do clã Satsuma (薩摩藩), do sul do Japão, em 1609, que manteve essa proibição durante o domínio feudal.

 

Essas medidas forçaram a população local a desenvolver, de forma sigilosa, técnicas de defesa desarmada e métodos de combate com instrumentos agrícolas, o que viria a dar origem ao Tī (手, “mãos”) e, posteriormente, ao Tōde (唐手, “mãos da China”), refletindo a influência marcial chinesa (Táng, 唐).

 

Transição para o Japão e Sistematização

 

Com o advento da Era Meiji (明治時代) em 1868, o Japão passou por um profundo processo de modernização e abertura ao Ocidente, conhecido como Restauração Meiji. Esse período aboliu o sistema feudal, dissolveu a classe samurai e introduziu valores, instituições e tecnologias ocidentais. O uso tradicional da espada foi gradualmente extinto, e as artes marciais começaram a se reformular sob novos ideais educacionais e filosóficos.

 

Nessa época, ainda não existiam estilos, graduações ou faixas no Karate. A prática era identificada apenas pelo nome do mestre e pelos kata (形) que ele ensinava. As distinções regionais passaram a ser conhecidas pelas localidades onde as técnicas eram praticadas, surgindo, assim, três principais tradições:

  • Shuri-te (首里手) – caracterizada pela leveza e agilidade;

  • Naha-te (那覇手) – marcada por movimentos circulares e respiração controlada;

  • Tomari-te (泊手) – com características intermediárias entre as duas anteriores.

 

Essas variações formaram a base para os estilos modernos do Karatedō.

 

Os métodos de ensino da época eram rudimentares e restritos. Os treinos ocorriam, em geral, de forma particular, com poucos discípulos e grande ênfase na repetição dos kata.

 

A Chegada ao Japão e a Modernização do Karatedō

 

O Karate (ou Tōde) foi introduzido nas ilhas principais do Japão em 1922 pelo mestre Funakoshi Gichin (船越義珍, 1868–1957), durante uma apresentação em Tóquio promovida pelo Ministério da Educação. Sua abordagem pedagógica e filosófica tornou a arte amplamente reconhecida, levando à criação do sistema Shōtōkan-ryū (松濤館流).

 

Posteriormente, outros mestres de Okinawa migraram para o Japão continental, como Mabuni Kenwa (摩文仁賢和, 1889–1952), fundador do Shitō-ryū (糸東流), e Miyagi Chōjun (宮城長順, 1888–1953), fundador do Gōjū-ryū (剛柔流). Apesar de Okinawa já ser parte formal do Japão, seus habitantes ainda sofriam preconceito social e eram considerados camponeses provincianos.

 

Durante a década de 1930, as autoridades japonesas exigiram a padronização dos métodos de ensino e nomenclatura das artes marciais. Foi então que Miyagi Chōjun denominou seu estilo Gōjū-ryū (“forte e suave”), e Mabuni Kenwa criou o nome Shitō-ryū, em homenagem a seus dois mestres: Itosu Ankō (糸洲安恒) e Higaonna Kanryō (東恩納寛量).

 

Esses mestres foram responsáveis por sistematizar muitas das técnicas básicas ainda praticadas no Karatedō contemporâneo.

 

O Karatedō como Caminho (道)

 

O termo Karatedō (空手道) foi reformulado por Funakoshi Gichin, que substituiu o antigo ideograma 唐 (Tō, “China”) por 空 (Kara, “vazio”), transformando o sentido literal de “mãos da China” para “mãos vazias”. Posteriormente, o sufixo Dō (道) — “caminho” — foi adicionado, simbolizando o ideal espiritual e ético das artes marciais japonesas.

 

Essa modificação refletia o pensamento filosófico do período e o ideário promovido pela Dai Nippon Butokukai (大日本武徳会), instituição governamental responsável por regulamentar os Budō (武道), os “caminhos marciais”. O Dō enfatiza que o verdadeiro propósito das artes marciais não se limita ao combate, mas à formação de indivíduos úteis e virtuosos, capazes de contribuir com a sociedade.

 

O Desenvolvimento Moderno e o Kumite

 

Até a década de 1930, o Karatedō baseava-se quase exclusivamente na prática e aplicação dos kata. O kihon (técnicas fundamentais) e o kumite (combate) foram incorporados posteriormente, influenciados por outras artes marciais japonesas como o Jūjutsu, o Jūdō e o Kendō.

 

Embora Funakoshi fosse contrário à ideia de competições, seus alunos universitários desenvolveram, nas décadas seguintes, métodos de Shiai (試合) — combates esportivos — que se tornaram a base dos torneios modernos.

 

Os mestres de Okinawa, entretanto, viam o Karatedō como uma arte de autodefesa e aperfeiçoamento pessoal, considerando o combate competitivo incompatível com o espírito original da disciplina.

 

A primeira competição moderna de Karatedō ocorreu no final da década de 1950, logo após a morte de Funakoshi, marcando o início da fase esportiva da arte.

 

Conclusão

 

Atualmente, o Karatedō é praticado em todo o mundo sob diversas perspectivas: arte marcial, disciplina filosófica, método educacional e esporte olímpico. Apesar das transformações históricas e culturais, seu princípio essencial permanece o mesmo — o cultivo do corpo, da mente e do espírito por meio do caminho das mãos vazias.

 

Referências

 

TANZADEH, Allen. Karate History. Shitoryu Karate Canada. Disponível em: http://shitokai.ca. Acesso em: 24 ago. 2017.

 

TANZADEH, Allen. Karate History. Sensei Tanzadeh Shitoryu Karate Cyber Academy. Disponível em: http://shitokai.com. Acesso em: 24 ago. 2017.

 

* Tradução e adaptações dos autores.

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